Gastronomia

Kissaten e a cultura do café no Japão

Depois de uma semana no Japão, minha amiga Andrea constatou: “Impressionante como qualquer café é no mínimo muito bom”

No Anteiku, Kaneki é apresentado a um universo totalmente novo: os pormenores técnicos da preparação de café.

Se você assistiu a Tokyo Ghoul, mesmo que apenas alguns episódios, provavelmente vai se lembrar do Anteiku: uma cafeteria que é uma das principais locações na trama. Ali, o protagonista Ken Kaneki vai vivenciar momentos-chave em sua vida e também aprender muito sobre si mesmo, sobre o mundo dos ghouls e sobre… como fazer um café perfeito. 

Em meio a todos esses desenvolvimentos, a obra nos apresenta um pouco sobre o que é um kissaten: em tradução literal, seria um estabelecimento para se tomar chá, mas que ao longo do tempo praticamente se converteu em templos dedicados ao café, especialmente no início do século passado – no cenário da abertura do Japão a países estrangeiros e o início de um rápido processo de absorção (e adaptação) da cultura ocidental.

Mas os kissatens não começaram a se diferenciar das simples cafeterias, que também existiam por lá. Em um café, o apelo maior era mais parecido com o de um bar – álcool, música alta e celebração. Já os kissas se tornaram lugares mais tranquilos e voltados para atividades mais intelectuais, como arte, literatura e música.

Yoshimura, o gerente do kissa, explica: Anteiku é um local de convivência e socialização.

Naquele tempo, em que ter vitrolas e adquirir discos exigia bastante dinheiro, os frequentadores eram atraídos pela oportunidade de apreciar não apenas um café, mas também boas seleções de jazz ou música clássica.

Com o passar das décadas, da Segunda Guerra Mundial e a transformação cultural do Japão, os kissatens foram perdendo público – especialmente os mais jovens, atraídos pelo apelo de grandes redes, no modelo Starbucks. Nos últimos anos, o movimento de revival vem resgatando especialmente os kissas com sua ambientação clássica, seja ela vintage ou retrô. E, acima de tudo, uma impecável seleção de grãos, muitas vezes torrados pelo próprio estabelecimento, e aplicação de equipamentos técnicas superiores para fazer não apenas o café, mas também bebidas variadas com o ingrediente.

O café é algo a ser levado muito, muito a sério.

Até onde eu me lembro, eu nem sabia que essa categoria existia quando fui a um kissaten pela primeira vez, em Tóquio, em 2014. Muito menos que tinha acabado de entrar em um. Estranhei o fato de ter pessoas fumando no salão, a decoração datada, e um café de um nível muito, mas muito acima do que eu estava acostumado. Agora, 10 anos depois, e graças a uma onda de revival (no Japão) desses estabelecimentos – tanto de estilo mais clássico quanto os mais recentes –, pude encontrar e frequentar alguns desses espaços com facilidade.

Até mesmo em São Paulo, onde já há alguns anos o Pato Rei (com lojas em Pinheiros e na Berrini) é um digno representante da categoria, nas versões com roupagens mais modernas. Cafés de microlotes sempre muito bem selecionados, com preparo impecável. Peça um okonomiyaki, omuraisu ou katsusando e tenha uma experiência de kissaten completa!

E, se estiver com férias programadas para o Japão, segue a lista de cafeterias que pude ir e recomendo:

Kissaten

COFFEE-TEI (Kohitei) – Ikebukuro, Tóquio

O delicioso Ambre de Reine, no Coffee-tei.

Um digno representante do estilo oldschool (não tem site, nem conta no Instagram), com decoração toda em madeira escura. Dentre as diversas opções de café, não deixe de provar o Ambre de Reine, um café encorpado com creme flutuando na superfície, servido em taça coupe. Passe lá para se recuperar das andanças no bombado shopping Animate Ikebukuro.

LILO COFFEE ROASTERS – Shinsaibashi, Osaka

No Lilo Coffee Kissa, o seu café vem acompanhado de cartões com informações sobre os grãos utilizados, e também sobre o barista responsável pelo preparo.

Um oásis de tranquilidade na muvucada área de Dotonbori. Também no estilo retrô, aqui você vai encontrar as especificações de cada café, como país produtor e detalhes de sabor. Além de  poder escolher o método de preparo. 

KISSA SHIMA COFFEE & BAKERY – Miyajima
Uma preciosidade na ilha de Miyajima, em Hiroshima. Apesar de ter sido fundada em 1966, o ambiente é bem contemporâneo. Serve cafés selecionados, preparados em variados métodos, como V60 e sifão. Não deixe de provar os sandos e o lemon cake, feito com limões da região e mel produzido na própria ilha.

Cafeterias

ONCA COFFEE – Fukuoka

A boa curadoria de grãos fica em exposição para você provar o aroma de cada variedade disponível no momento. Para acompanhar, comidinhas deliciosas como pães, sandos e cookies, em ambiente clean moderninho.

HOLIC COLOR DRINKS – Setagaya, Tóquio

Nem a pannacotta consegue escapar dos maneki neko nessa parte de Setagaya.

Próximo ao templo de Gotokuji (aquele dos milhares de maneki neko), essa pequena loja, escondida em uma galeria, é um achado. Prove o delicioso matcha latte e a pannacotta de Cointreau acompanhada de geleinha de gengibre – tudo feito na casa.

CLOUDS ART + COFFEE – Koenji, Tóquio
Fica pertinho da estação de Koenji, um dos meus bairros favoritos na cidade. Misto de galeria de arte e cafeteria, tem menu e espaço reduzidos, mas oferece uma experiência bacana.

FUGLEN – Asakusa, Tóquio
Quando quiser um café da manhã de respeito, venha conhecer a loja de origem norueguesa – e decoração também. O ambiente é maior e pode ser mais barulhento, mas possui salas mais isoladas. Pode ser uma boa para começar o dia e seguir para o templo Senso-ji, a 4 quadras dali.

PANZEDINA – Asakusa, Tóquio
Essa lojinha fica nas proximidades da rua Kappabashi, especializada em artigos de cozinha. Bem pequena e aconchegante, é ótima opção para aquela pausa depois de andar atrás de woks, chawans, hashis, panelas para tamagoyaki e cestos para cozinhar macarrão de lámen.

A FEW WORDS COFFEE – Shinjuku, Tóquio
Um café bem pequeno e bem sério, escondido entre ruelinhas tranquilas da movimentada Shinjuku. A oferta de comida parece variar com o humor do proprietário, então é prudente ir confiando apenas na qualidade do café.

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